3 MINICONTOS INÉDITOS DE ROBERTO SCHMITT-PRYM
Mefisto
É um gato preto que vê as pessoas passarem com indiferença solene das alturas de um muro antigo, cuja pintura foi testemunha e vítima do tempo. Ninguém sabe quem o batizou, mas todo mundo sabe o seu nome. Às vezes, se digna a mover a cabeça lentamente da esquerda para a direita e depois fecha os olhos e boceja. Outras vezes, os cães latem, mas ele permanece imperturbável, inatingível. À noite, é diferente: sai para caçar almas e fazer jus ao seu nome.

Pelo caminho
Ele a arrasta em direção à colina, através dos arbustos, para o caminho que corre ao longo da encosta. Ela descansa a cabeça no seu ombro. Assim, andam pelo caminho estreito e úmido, paralelo à rodovia, até as duas casas vizinhas onde moram os pais. Ele se acalma um pouco e a beija de novo. A escuridão toma conta da paisagem. Ainda está com medo. Continuam andando sem pressa. Atrás deles, do outro lado da colina, o céu tingido de vermelho sangue.

Espelho
Duas imagens, duas figuras, duas respirações ofegantes, duas armas, dois olhos um de frente para o outro. Um é ele, o outro também. Está lutando contra a vida ou a morte contra si mesmo. Não pode adiar. Um aperta o gatilho e outro também. O espelho coberto de sangue. Duas imagens, duas imóveis, duas armas no chão, dois olhares que não se encontram mais. Um homem morto.
Roberto Schmitt-Prym nasceu em 1956, em Panambi, RS. É autor de “Contos vertiginosos”, “Sombra silêncio”, “Onde o vento aumenta a sombra” e “O sacrifício da cavalaria”. Foi destaque no Prêmio Habitasul Revelação Literária 1979 e no Prêmio Habitasul Correio do Povo Revelação Literária 1981. Estudou com Charles Kiefer e com Luiz Antonio de Assis Brasil. Participou das antologias “Contos de oficina 35”, “Brevissimos!” e “101 que contam”. Publicou a tradução da obra “Giacomo Joyce”, de James Joyce. Foi diretor da Associação Riograndense de Artes Plásticas Chico Lisboa, diretor da Bienal do Mercosul, conselheiro da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre e diretor do Museu Julio de Castilhos.