5 POEMAS INÉDITOS DE ANDRÉ MARTINS

in memoriam

sufocado sob violetas
ele morreu silenciosamente
não saiu no jornal
não houve consternação

seu nome era outono
da tribo dos equinócios
tinha os mais belos dias
a luz preferida por monet
boa temperatura para o tinto

morreu como veio ao mundo
entristecido
sob a copa das árvores
deixa folhas

obsoletras

assim como outras máquinas e pessoas
a máquina de escrever tornou-se inútil
peça de um mundo com pressa mecânica

os datilógrafos
o papel carbono
a matriz de mimeógrafo
e o errorex
foram salvos no passado

para copiar basta um ctrl + c
para apagar é só deletar
embora o erro insista em objetar

leia antes de ler

o sanatório e o nosocômio são subsubdivididos:
cinco mil alas indefinidas para os sem razão
desnudarem seu baú de algaravias perplexas
por labirintos de dimensões invisíveis
eles mergulham em poças de paixões secretas
desamarram os cadarços dos lugares-comuns
explodem balões com acentos ortográficos
circundam as horas em cirandas e novenas
e empinam asas para catapultar os muros
eis que são de matéria idêntica a dos poemas

o diretor

upgrade

meu amor
o amor virou commodity
sem discussão
aprenda a negociar na bolsa

não não não não não não
nada errado com a sua linda coleção
digo bolsa dos novos valores
o que o amor vale ou não
suas flutuações diárias
seus humores mercadológicos
perceptíveis aos mais sensíveis

procure entender meu amor
o amor este de que falamos
para a maioria dos investidores
é um lance no pregão
uma carta de crédito
um débito em conta
uma especulação

memórias esquecidas

de todas as coisas presas no caminho
a olivetti lettera 32 penhorada para pagar aluguel
os livros e os discos abduzidos por amigos queridos

pessoa
e.e. cummings
dois volumosos drummond
de uma levada só

– quem?

de todas as coisas despreendidas
aquela cor clarividente da manhã
os lábios roxos de frio na porta do bar
aqueles acordes de new chautauqua
teu o que era eu

André Martins é publicitário, editor e redator do periódico on-line O Bah.

POESIA

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