DOIS DEDOS DE PROSA SOBRE A FINA COMPANHIA DA DIRCE MELLO, por Joselma Noal

Quando peguei o livro de estreia da Dirce Mello, já sabia que, como era dedicado ao Chico, me agradaria, porque gosto demais do artista. Mas não se trata apenas de uma homenagem ao artista, é uma homenagem à vida, à musica, à literatura, ao amor, às memórias e a toda mulher escritora que tem coragem de se desnudar, através da palavra. Então o livro muito mais que me agradou, Eu & Chico – Sete anos da mais fina companhia me encantou!

Dirce Mello é Dirce de Melo Teixeira, atuou como arte educadora, assistente social, professora aposentada do DSS/UFPB e doutora pela PUC/SP. É terapeuta pelos métodos do Pathwork®, Constelações Familiares, Mãos de Luz e Florais de Bach. Dirce nasceu em 19/06/50, aniversaria no mesmo dia de Chico Buarque, o que motivou a escrita do livro. Ao ler o Eu & Chico, o leitor saberá muito mais sobre esta carioca brilhante narradora.

Sobre o visual do Eu & Chico – Sete anos da mais fina companhia, na capa temos duas cadeiras, uma mesa ao centro e sobre ela duas taças de espumante servidas e encostadas como em um brinde. Ao ler, me senti ali dentro daquela imagem, tocando minha taça e brindando com eles, me senti entre as duas finas companhias: a do Chico e a da Dirce.

O título da obra da Dirce Mello diz muito: Eu & Chico – Sete anos na mais fina companhia. Assim sem sobrenome, claro, só podia ser o Chico Buarque e o número sete não estaria ali por acaso. Sete é número mágico e sobre ele diz a autora, após pesquisa do verbete do dicionário mitológico: “Mas o que gostei mesmo foi do 7 como regulador das vibrações. Tamos com tudo e não tamos prosas! Que belo horizonte temos à frente. E só lembrarmos do arco-íris e logo tudo ficará colorido para nós, nada de retrato em preto e branco mais, cara!”(p.224) Sim, as páginas do livro permitem o ver o horizonte e o contemplar o arco-íris. A Dirce apresenta ao leitor um mundo muito mais colorido!

E, sim, estar entre os dois artistas é estar na mais fina companhia!

A prosa da Dirce me conquistou nas primeiras linhas, na apresentação: “Eu e Chico foi escrito como se eu conhecesse o sujeito a vida inteira, impressionante até para mim!” (p. 7) E após a apresentação: “Acho perfeito nos conhecermos de forma livre, sem roteiro, sem direção, é tão bom saber aonde vamos chegar!  Estarmos em cena com poderes totais… nada de diretor, continuísta, contrarregra, maquiador… somos todos ao mesmo tempo nesta coprodução. O que, excitante? Saiba que só estimula. Tenho certeza que saberemos afinar o piano juntos.” (p. 17) A Dirce é uma excelente narradora, parece conversar direto com o leitor, toca na mão dele ao virar cada página do livro. A leitura flui com suavidade e com bom humor.

“Quanta coisa na vida da gente, né, Chico? Você, já menino, queria ser cronista, escrevendo no jornalzinho do colégio e quem diria que essa sua história ia bater em mim agora, sessentona, me ajudando a ser cronista… A vida é bela, cômica, crônica”. (p. 215)

Sobre o gênero, Dirce se apresenta como cronista, sim, o livro pode ser classificado como crônica. Mas também pode ser considerado um romance. Embora possa ser lido como um grande diário, tendo em vista que sempre há uma data na abertura de cada título, cabe ressaltar que não é escrito todos os dias, há saltos no tempo.  Prefiro chamar a narrativa da Dirce de autoficção, transvestida de diário ou de crônica ou de romance.

Os títulos de todas as divisões (páginas de diário, capítulos, crônicas) são datados e intitulados com letras de músicas de composições de Chico e são entremeadas com trechos das letras das mesmas canções, referenciadas em nota de rodapé. O leitor pode ouvir as músicas, enquanto lê, nem precisa enviar playlist separado como muitos escritores fazem agora, a Dirce coloca a música no corpo do texto, ou melhor, é a música que dá corpo ao texto. As histórias são tecidas com fios de músicas e de memórias. A canção é o elemento motivador para a escrita, que não fica centrada em interpretar a letra da canção, é um propósito para as divagações da autora que conta a vida, se desnuda, se revela em uma conversa com o Chico e com o leitor, que se sente fazendo parte desta prosa. O leitor passeia de mãos dadas com o Chico e com a Dirce pelas composições do Chico e pela vida da Dirce, como se amigo fosse dos dois artistas.

“O Violão está fraco, está rouco?  Toca pra frente, a noite é criança, o samba é menino e a dor é tão velha. Duvida que não haja mais quem cante e ninguém queira sambar. Foi pura superstição sua. Seu padre toca o sino, tem dó da menina aqui. Eu tenho a impressão que o samba vem aí, um samba tão imenso que eu… Ah! Deixa pra lá, tem samba de sobra, olê, olê, olê olá…” (p.205)

Eu me senti feliz e honrada de estar em tão finas companhias, a da Dirce e a do Chico, durante toda a leitura e me emocionei rememorando as canções do Chico e conhecendo as histórias da autora que sempre andou pela vida acompanhada da mais fina companhia que é a da arte, da música e da literatura em especial, e divide com o leitor a sua forma bonita e leve de conduzir seus dias em uma conversa com o Chico Buarque tão informal e envolvente.

Que estes meus dois dedos de prosa tenham revelado um pouco sobre a bela prosa da Dirce!

Eu & Chico – Sete anos na mais fina companhia de Dirce Mello foi publicado em 2017 pela Editora Autografia do Rio de Janeiro e pode ser adquirido no site da Editora ou com a autora. 

Joselma Noal é escritora, Professora Adjunta ILA/FURG, Doutora em Letras.

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