5 poemas de Leonardo de Oliveira
Silenciosa como um vaso de flores
No quarto cheirando a vinho e cigarros.
Desarrumou as gavetas, só pra arrumar de novo.
Sob a luz da meia tarde as rosas murcham
O mundo em chamas.
Janelas verdes, ar parado, asas cortadas
Borboleta aprisionada sob o vidro.
Outro cigarro, outro filme, a noite se avoluma.
O silêncio se intensifica, grita.
Ninguém sabe do amanhecer, ciência inexata.
A densidade do mundo se junta à fumaça do cigarro
e ela traga.
-Que a noite me traga alento – disse ao vento,
E a luz se apaga

Levo na mochila
Um garrafão de vinho barato
Barthes e Lorca,
Para tempos de crise.
Nos bolsos das calças e nas ventas
Cigarro, fogo, fumaça, incêndio.
Nas mãos lonjuras
Entalhes, escavações,
flores pretas da Turquia
No bolso do casaco
Um poema alugado
E outro escarrado,
Pra épocas de luta
Nos olhos, nas pálpebras
levo tua imagem
Teu nome, teu cheiro, revolução.
Nos passos levo pressa
E um peso de pedras que herdei.
As notícias são ruins.
São tempos difíceis,
E eu só não carrego comigo certezas.

Paus, pedras e átomos,
Ragnaroks sutis,
pequenos apocalipses no quintal,
na sobra da pele do cotovelo.
Buracos negros de mesa.
Sabe do que falo, não?
De gestos
minutos,
suspiros,
o mar da tranquilidade
e suas crateras,
suspiros.
A camisa do seu Edmilson,
pequenos massacres ciliares,
um Armageddon no formigueiro,
no pátio dos fundos da dona Salete,
bem do lado da laranjeira.

Coo o ranço da manhã na cafeteira
pra beber flores.
Filtro a ânsia dos abraços
com sóis menores,
e alguns raios de horizontes
nascem pelos poros/venezianas.
Perco as frutas amarelas do bolso,
descuidado sonhando nuvens,
e tragando maços de solidão
mentolada e sem filtro.
Preencho papéis com idas e vindas,
rio dos desníveis no apê.
Ah quem dera sobrevoar as bandeiras piratas
com versos/naves/corpos sem órgãos.
Quem dera eu percorrer a tua vista da janela.
Aqui na noite, ascendo as chamas cítricas,
enquanto chove o céu aqui na areazinha,
e te confesso: volta e meia as samambaias
sussurram teu nome.

Lareira de Youtube
Parece fogo
Tem jeito de fogo
Mas não esquenta
Leonardo de Oliveira é poeta músico psicólogo mestrando no PPGPSI da UFRGS, onde pesquisa arte e população de rua. Participa de projetos de arte e música experimental. Autor do livro de poesias “O Ano do Elefante” publicado em 2022 pela editora Appris, busca alianças poéticas contra a inquisição espanhola na observação do micro bestiário terráqueo, seus rodinhos de pia e dissonâncias possíveis.
