PORTO ALEGRE: UMA BIOGRAFIA MUSICAL – entrevista com Arthur de Faria
Nessa edição de Sepé, conversamos com o professor, músico e pesquisador Arthur de Faria. O Arthur acabou de autografar aquele que é o primeiro volume da sua “Biografia Musical de Porto Alegre”, numa edição da Arquipélago Editorial. Até aqui, é um projeto de quatro livros. Para saber mais do andamento de seu trabalho de pesquisa e conversar um tanto a respeito do livro, entrevistamos o autor para os leitores da Sepé.
Teu livro é uma história musical de Porto Alegre, mas supera bastante a questão musical, quer dizer, é um documento a respeito da cidade e de como se viveu a experiência da música por aqui. Pode ser lido como história da música, mas também como antropologia cultural. Nele, pode-se acompanhar também a história da mídia e dos espaços culturais da cidade ao longo da história. Na tua visão autoral e de pesquisador, há algum momento de toda essa história que te chama mais a atenção? Como, por exemplo, um momento de apogeu? Ou “apogeus”?
Nesse primeiro volume, sem dúvida os anos 1920 e 1930. A cidade efervescia de novidades, como de resto o ocidente destas décadas. Foi a chegada do cinema, das jazz bands, o começo do rádio, o samba explodindo de um instante para o outro e, ao mesmo tempo, era um momento em que Porto Alegre ainda tinha muitas das particularidades que depois seriam patroladas a partir do ultranacionalismo unificador que Getúlio impõe a partir do Estado Novo.
Em contrapartida, quais os momentos de “crise” que tu apontarias e como se lidou por aqui com os momentos de transição musicais, como, por exemplo, os que são visíveis nas transições da era do disco, do cinema, do rádio e assim por diante?

O livro termina justamente no grande apocalipse local que é a chegada do videoteipe. Quando a televisão começou a roubar em massa os anunciantes de rádio e as emissoras tiveram de demitir suas centenas de artistas contratados, quase todos migraram para o novo meio, que era feito todo ao vivo. Nunca antes nem depois os portoalegrenses viram tanto seus artistas quanto nos poucos antes que correram entre este momento e a chegada do videoteipe, que matou quase instantaneamente a TV ao vivo, mantendo só o jornalismo e desempregando novamente centenas de músicos, cantoras, cantores, atores, atrizes, diretores… Foi a migração em massa que expulsou daqui gente como Elis, Breno Sauer, Manfredo Fest e dezenas de outros músicos – pra não falar no pessoal do teatro, que fazia o teleteatro.
Como quem participou e acompanhou a campanha de financiamento do livro (e de tantos outros projetos literários que têm se valido dessa modalidade de financiamento), como tu avalias toda essa parte de produção do livro? Foi bem, foi mal? Poderia ter sido melhor? Como foi o engajamento dos leitores na campanha?
Eu tive a imensa alegria de não ter de me preocupar com nada disso. A equipe da Arquipélago Editorial cuidou de absolutamente tudo. Foi a primeira experiência em um financiamento coletivo tanto deles como minha, e só deu alegria: fechamos com quase 110% da meta atingida.
Na introdução do livro, tu comentas que este trabalho resulta de um acúmulo de 32 anos de pesquisa e reunião de fontes e que há ainda pela frente vários volumes dessa história musical. Esses volumes já estão escritos? Qual o “estado da arte” desse projeto e que os leitores podem esperar na sequência de “Porto Alegre: uma biografia musical – Vol. 1”?
Pela ordem cronológica, esse é o primeiro livro. O II será “Radamés Gnattali, uma Biografia Musical”, que eu devo terminar de escrever ano que vem. O III é “Lupicínio – Uma Biografia Musical”, que foi também meu doutorado em literatura brasileira pela UFRGS. O texto tá pronto, e o livro sai ano que vem. O IV é “Elis – Uma Biografia Musical”, lançado em 2015, vendendo bem desde então. O V será “Porto Alegre – Uma Biografia Musical, Volume II”, que eu venho escrevendo aos poucos e publicando na revista Parêntese do Grupo Matinal. Sabe-se lá quando virão o VI, sobre a música regional gaúcha em Porto Alegre, e o VII, sobre o rock em Porto Alegre. Tenho trabalho pra mais uns 15 anos, certamente.
Arthur de Faria é músico, arranjador e compositor. Doutor em Literatura Brasileira pela UFRGS com tese sobre Lupicínio Rodrigues, produziu 28 discos e dirigiu 12 espetáculos. Escreveu 52 trilhas para cinema e teatro em Porto Alegre, São Paulo e Buenos Aires. Lidera a Tum Toin Foin Banda de Câmara e integra os grupos transnacionais Música Menor e Surdomundo Imposible Orchestra (com uruguaios, brasileiros e argentinos). Lançou 20 álbuns, EPs e singles e tocou em meia dúzia de países. Ministra cursos sobre música popular brasileira no Brasil, Argentina e Uruguai. Trabalhou 23 anos em rádio e três em jornal. Publicou ensaios, artigos, fascículos e livros sobre música popular — entre eles, Um século de música no Rio Grande do Sul e Elis: uma biografia a musical.
