VOL. 4, Nº. 9/2023
Navegue pelo sumário da edição.

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Lançada no começo de março de 2023, a newsletter Redemoinho surge para trazer conteúdo noticioso e analítico a respeito da literatura brasileira. O projeto é iniciativa de e elaborado por Rafael Glória, que é também editor-fundador do Nonada Jornalismo. Com o Nonada, foi finalista em 2017 do Prêmio Parceiros da Escrita, da AGES – Associação…
Leia mais REDEMOINHO, uma newsletter literária – entrevista com Rafael Glória
Publicado em 2022 pela Editora da UFGRS, o livro Matérias da memória da Profa. Maria da Glória Bordini é uma compilação de ensaios e artigos que ela publicou e apresentou a partir do trabalho de conservação da documentação e acervo de Érico Veríssimo. No livro de acesso aberto que pode ser lido a seguir, há…
Um regente do acaso para Raul Sarasola O encarte da exposição traz o artistaempilhando discos de pedra lisa-gravity meditation não dualista-em três fotografias sem camisa (A pilha suspensa em ésse, o desnível,repele a queda mas captura a ameaçaAproxima o possível do impossívelalinhando o centro de cada massa) Vem do caos o seu olhar polifacéticoRaul se…
Do livro inédito e em preparo Tons de tudo. Soneto 46 (invernal) No inverno, não conheço quem consigamanter o bom humor na tarde escura.Entre as ruínas da carne ou da utopia,as lágrimas confundem-se com a chuva. As folhas todas já caíram, secas:sobre elas, nosso ânimo rasteja.A noite é longa; a luz, escassa; o solnão chega…
A terra engravidacom a chuva de verão –vai molhar o campo A flor luminosano meio do meu caminho –mas é pleno outono Parada no tempoa moça transforma-seem fotografia José Eduardo Degrazia nasceu em Porto Alegre em 1951. Publicou dezenas de artigos e crônicas em jornais e revistas do Brasil e do exterior. Tem publicados os livros…
Leia mais 3 haicais de José Eduardo Degrazia traduzidos por Shogoro Nomura
“A censura é tão antiga e onipresente como a própria escrita”George Steiner Heberto Padilla foi poeta e jornalista cubano, nascido em Puerta del Golpe, Pinar del Río em 20 de janeiro de 1932 e falecido no estado do Alabama, Estados Unidos em 2000.. Em 1968, o seu livro de poesias “Fuera de del Juego” venceu o Prêmio “Julián del Casal”…
Leia mais 2 poemas de Heberto Padilla traduzidos por Dilan Camargo
Imagine-se um mundo sem redes sociais, sem internet, sem televisão, sem rádio ou jornais. Este é o mundo de Sombras na Correnteza, romance histórico que Cyro Martins publicou aos 71 anos de idade, em 1979, e que tem como pano de fundo a centenária Revolução de 1923. Talvez o mais certo fosse dizer que se…
Leia mais A REVOLUÇÃO DE 1923 NO OLHAR DE CYRO MARTINS, por Lucio Carvalho
Lançado na Feira do Livro de 2022, A araucária e a gralha azul: uma história dos antigos Kaingang está agora livre para download nos sites da editora Libretos e da editora da Fundação Ministério Público. O livro é uma edição bilingue (kaingang e português) e conta a cosmogonia Kaingang. Num de seus principais mitos, em…
Leia mais A ARAUCÁRIA E A GRALHA AZUL: UMA HISTÓRIA DOS ANTIGOS KAINGANG
O texto integra o livro “Labirintos da realidade:diálogo de Clarice Lispector com Machado de Assis”. Encontramos no Dicionário Aurélio a seguinte definição para obliquidade: ”[Do lat. obliquitate. ] S.f. 1. Posição do que é oblíquo. 3. Inclinação em direção oblíqua. 4. Tergiversação, evasiva, rodeio. (…) Adj. 1. Não perpendicular; inclinado; de través. 2. Torto; vesgo. 3.…
Leia mais A FRUTA DENTRO DA CASCA: O NARRADOR E A OBLIQUIDADE, por Cátia Simon
O capítulo aqui disponibilizado para leitura abre o livro “Pós-escrito a Dante Milano & uma biografia construtivista”, publicado pela TAN Editorial em 2022. Thomaz Albornoz Neves é poeta, tradutor e editor na TAN editorial.
Leia mais PÓS-ESCRITO A DANTE MILANO, por Thomaz Albornoz Neves
Os poemas selecionados integram o livro Narciso Selvagem,publicado em 2022 pela editora Penalux. ode ao meu país para Yannik meu país nasce de repente assimdo verde sumo de meu jardim das plantas deitadas na terra escura fecundada pela chuva em mimnasce de repente como sua bandeiracheia de romances e ternuras − trigueirapor cima de tratados geográficos por cima de…
Leia a seguir o segundo capítulode Os automóveis ardem em chamas,publicação da Editora Penalux. Caminhavam em grupo, se esbarrando e trocando de lugar conforme falavam. Além de Mauro e Carla, estavam Eulália, Epitácio, Juvenal e Walter. Esses eram os seis inseparáveis. Todos de calças Lee e cabelos compridos, com exceção de Walter. Até Mauro deixara…
Leia mais De ‘OS AUTOMÓVEIS ARDEM EM CHAMAS’, de Marcel Novaes
Leia a seguir um dos contospresentes no livro, Quarto 5. Em A Casa de Estudantes, Magali Lippert nos brinda com contos que montam um quadro dos moradores da casa de estudantes da Universidade Federal em Porto Alegre, mas que podem representar o cotidiano de qualquer casa de estudantes. As histórias são contadas tanto por um…
Leia mais CONTOS DE RAZÃO E ABSURDO, por Marcia Ivana de Lima e Silva
Javier Marías e eu quase nos encontramos por acaso um dia. Eu o reconheci pois havia sido apresentado a seus livros por uma pessoa que o conhecia muito bem, e desde o momento que essa pessoa, Cristina, me apresentou a ele, senti-me completamente enfeitiçado por sua prosa e passei a ler compulsivamente todos os livros…
Leia mais UM OBITUÁRIO SENTIMENTAL: Javier Marías (1951–2022), por Aguinaldo M. Severino
O AMOR DO POETA Contigo faço o que a primavera fazcom a cerejeira –diz o poeta –frutas do matoavelãs e beijos colho para tia moça não diz nadasorri e olhacom olhar lânguido e ambíguocom admiração e nostalgiaapenas isso: olha e sorriuma mãe ou uma irmãfeito uma puta ou como uma aeromoçaigual àquela sob o qual…
Leia mais 2 poemas de Attila Bálazs traduzidos por José Eduardo Degrazia
O poema selecionado integra o livro Matéria do Sopro,publicação de 2022 da editora Urutau. À pátria do espírito hei de ir um diaantes das Parcas silenciaremaquele que delas se ria. Dos Antigos verei o que ainda restae ao poente entre colunasserei luto e serei festa. Ezra Pereira nasceu e cresceu em Lisboa nos anos 80…
Primeiro capítulo do romance Desvarios entre quatro paredes, de Cassionei Niches Petry, Editora Bestiário. 04/04 já vivo em confinamento atrás das paredes da minha biblioteca há muito tempo, nesse trabalho de escritor de quinta categoria que vende histórias para quem não sabe escrever histórias e quer publicar seu livro para ser vendido para os amigos…
Leia mais De ‘DESVARIOS ENTRE QUATRO PAREDES’, por Cassionei Niches Petry
Lançado em 2022, “Iberê Camargo: um homem valente”, de Nilma Lacerda,parte das telas mais marcantes e também dos textos memorialísticose ficcionais deixados por Iberê para recriar a sua trajetória.É o primeiro volume da coleção Tipos Raros, projeto da Editora Mínimo Múltiploe traz prefácio de Adriana Calcanhotto, texto de orelha de Silviano Santiago,apêndice de Lucas Colombo,…
Leia mais DE ‘IBERÊ CAMARGO: UM HOMEM VALENTE’, por Nilma Lacerda
De “Nada que se assemelhe a qualquer animal vivo”,lançamento de Gabriela Porto Alegre pela editora Urutau,publicamos o poema “te dizer adeus é descer semfreio uma serra em pleno temporal”e o texto de orelha da poeta Juliana Blasina. O que permanece na certeza de que tudo convalesce? Juliana Blasina Em seu livro de estreia, Gabriela Porto Alegre nos diz…
Leia mais De ‘NADA QUE SE ASSEMELHE A QUALQUER ANIMAL VIVO’, por Gabriela Porto Alegre
Os tubos vencidos de oxigênio não servem para nada, são apenas lixo, é o que ele me dizia depois de tossir um pouco enquanto pedalávamos pela periferia da cidade em busca do agrião. A paisagem aqui há muito não assusta ninguém e expedições ao agrião selvagem são cada vez mais comuns. O agrião, ainda poucos…
O conto integra o inédito impressoMágico deserto: contos fora de forma. Quando todos se mandaram, aí pela grande crise do Plano Cruzado nos anos 1980, Sinistrus Joe permaneceu na ponta de uma praia oculta em Florianópolis. Vive só, numa casa de pau-a-pique, ao lado de gigantesco menir arqueológico. Ninguém dá bola para ele. É a…
Tradução de Paulo Damin. Sua única visita coincidiu com a lua cheia. Me lembro de procurá-lo com os olhos pelo campo inundado de branco, de tentar identificar sem êxito seu corpo maciço entre os eucaliptos e as touceiras de rabo-de-raposa. Em certo momento da noite, da janela alta, cheguei a distingui-lo cruzando o alambrado devagar,…
Este escrito tem como base o que vi e ouvi, nos dois anos e poucos meses de convivência com o professor Raul Ornelo de Oliveira Neto. As fontes são seus textos e a memória de suas falas. Quanto aos primeiros, esta narrativa se consolidou no que li e entendi (sua letra era terrivelmente desleixada) e…
Leia mais A HISTÓRIA DO DESMAIO, por Wellington Amancio da Silva
Os poemas integram o livro Manual de Sobrevivência,publicado pela editora Bestiário em 2022. VIDE BULA Ele contava os dias conforme prescrição médica. Media em comprimidos o tempo e não olhava mais pela janela.No fundo sabia que, sendo sol ou chuva, mais tarde isso não importaria.Contava os dias sem os ter vivido. NA FOLHINHA Entristeço na…
Leia mais 5 poemas de ‘MANUAL DE SOBREVIVÊNCIA’, por Armando Severo
Viver de sonhos e utopiasViver amanhãO que hoje nos faltaViver a fúria do desejoNa serenidade da esperança. Eu sou a promessa que nunca se cumpreO deus sem céuO rei sem reinoO homem sem destino;Eu sou a Jerusalém sonhadaAbandonada em favor de utopiasEu sou a promessa encarnadaMas quem me deseja real? Eu sou eu e meus…
Discipulado Incapazes de desvendá-lo,o tomamos como fruição:e é sempre o mar que nos desvenda. Lantejoula A menina, ainda em seus quatorze anos,anotava o nome dos que não a notavam.Nem era ninguém, mocinha ainda,e já tecia galáxias em seu coração de fiandeira. Pêssego Tua penugem, teu esse tal descalabroDe deitar urticária nas sanhasTeus pelos friccionando-se contraOs…
Jenny segurou a minha mão,Ela me levou através da tempestade.“Para onde estamos indo?” – perguntei –E uma voz (que eu nunca tinha ouvido) sussurrou:“Para dentro para dentro para dentroOnde os pássaros não cantamE um mar invisível reverbera.” Não havia como não segui-la,Não havia como não amar aquela imensa solidão.E sem que percebêssemos caímos em um poçoSinistro…
Aos pedreiros Fazer um poema que nem o pedreiro,assim, vai e bota mais uma palavra,não, duas, e meia, que é mais certeiro,vai que abra essa tábua, e o nosso celeironão fique de pé, que eu já tô calejado,e é, bem amarrado, depois que isso seca,cimento com ferro, dá um nó que… não é?A gente não…
Dois mil e um A última vez que te vifaz quase vinte anosda roupa não me esquecie nem dos teus planos A odisseia longe da famíliaque por acasotambém é minha O carnaval com os amigos quete impediriam, tenho certezate mantendo viva Não estavaentre elesa armao tempo todote observando. 1 de setembro de 2020 2020 A…
DE DENTRO PRA FORA É de dentro pra fora que começoa esfregaro limo crescidoaderidoreprimido inspiro pântanos inteirosexpiro prantose um lamento derradeiro derramo lamasmenstruo lágrimase a dor não purifica nadase queres saber a dor não purifica nadano meu sofrer. ENFIM o ano finda, amore apenas o mesmo torporem mimvinga um eterno sentimentode promessae tropeçoouço longe um…
O vento toca seu rosto —definha sob a janela.Tocar-lhe-ia o coração,carne feita vela? Da flor de sua mão, já se foramos rastos do jasmim.De seu corpo, o sol roubara o calor;no vestido, deixara o carmim. No ocaso,ela é pálida e imóvel.A luz esquálida,por acaso,não lhe ilumina o corpo.Flor de mil tons,seus olhos permanecem foscos. No…
Não me acho uma pessoa curiosa, daquelas que se envolvem com qualquer fato que não lhes diga respeito, sou muito autocentrado, mas, outro dia, saí para passear com o cachorro e vi no chão, perto de uma lixeira de rua, um envelope subscritado que parecia ter algo dentro. Fiquei intrigado, mas disse para mim mesmo,…
Este conto faz parte do livro “De fogos-fátuos e de águas-furtadas”, atualmente em processo de edição. De qualquer forma, isso pouco interessa. Independentemente de teoria ou versão, o fato incontestável é que Thor desde logo conheceu os efeitos do espírito no corpo, entendendo o espírito na líquida acepção. Tão cedo que o seu metabolismo assimilou…
Todos os sinais são de que a obra está terminando e, em breve, o novo edifício fronteiro a minha sacada será o lar desejado e protegido de muitas famílias bem postas na vida. Até agora foram elogiáveis os cuidados com a proteção dos trabalhadores na construção do Village Garden, mas hoje, no oitavo andar, um…
O desafio veio rápido: num instante eu estava quieto no meu canto, assistindo a um desenho animado idiota na tevê. No seguinte, me encontrava diante do meu quase melhor amigo, me esforçando para não parecer apenas um menino. Mandei-o procurar outro para encher o saco. No entanto, ele não me ouviu e ainda falou que…
A lasca de sardinha caiu sobre o telhado. Por pouco não atingiu Ângela. Justo no dia do seu aniversário. Estilhaçou os andares da casa, desfaleceu no meio da sala. A prima mais nova, Carola, quatorze anos recém-completos e com o apetite de um batalhão, engolia a pizza caseira quase sem mastigar. Sentada na cadeira, instalada…
Leia mais SOBRE O ÚLTIMO ANIVERSÁRIO DE ÂNGELA, por Anaí Bueno
Os poemas integram o livro Emovere, publicação de 2022 da editora Dialogar. DEPOIS DO FUTURO ainda não sei bemcomo funcionaessa tal realidadepois sigo provisóriouma angústia no lado esquerdouma vontade do passadode estilhaçar a vidraçadiante de todos os presentes me disseram que tudo é possívelpelas mãos da tecnologiainventar o homem, vencer a mortemas me advertiramque morrer…
Os poemas integram o livro Primitivos, publicação de 2022 da editora Dialogar. CARMA DE DISPAROS Percorrendo entre livrosEm busca das primaveras O povo, em seu pleno florescer,Exprimiu-se nas mais rubras das ideias Quantos mais discípulos de TolstoiDevemos cultivar em nossos laresAté que as paredes já não ouçam tiros? Insistentes na potência das armasImprimimos a sangue…
O conto integra o livro Contos de morte,de Danilo Giroldo. Publicação de 2022 da editora Patuá. Ouço o despertador do celular muito ao longe e lentamente vou retomando a consciência. Essa é uma daquelas manhãs que acordo sem saber ao certo onde estou, como fui dormir e o que eu tenho na agenda. O quarto…
Trecho de Mil placebos,publicação da Uboro Livros. Minha mãe, ao perceber que eu a observava, virou-se para mim, tentando não manifestar o que sentia, mas eu era capaz de perceber. Estava assustada, comovida, surpresa. Ao mesmo tempo, desejava que eu me sentisse seguro, do mesmo jeito que almejava solidez em meio às recentes tempestades que acometiam…
quantas marias promessasmas ao fundoum gritoouvidos feitos daquele gritoum afagotransforma-se emum tapapescoço feito de mãosque sufocamburaco negro na órbitaolhos sem faceolhos e ouvidos que vigiam por dentroo que faz um animalpermanentementeameaçadodispara golpes no arno nadanuma tentativa de defesaaté entrar em estadoletárgicoporque é o alvo da violênciao corpo repeleprojeta-se para foraem suspensãoencontraum local onde não o…
CARTA A UM AMIGO MORTO Curti a cartaEscrever à mão é saudávelCoisa plásticaAplaudi a sua cançãoEscrita livreToques fanopáicosBonitoConcordo: o sol sapeca quem escolhe o caminho “off road” da vidaJá estou ficando bronzeado, sem dúvidaVocê tem razão quando diz que não dou valor ao meu trabalhoNão dou mesmoMais importante é fazerNão quero estar na trilha da…
TIPO Estrela guiaDe galhosGuirlandasNossos joelhosDobramSinos badalamA performance do asnoNos supera.Espera!Eis as demandas. PAUL NEWMAN Era tudo inocente.Até chegar a gente.Para destruir os nomesE tomar a frenteDas feiras e das festas.O rosto sombrioAparou as arestasSem soltar pioEle soma o dramaE some entre dronesAfiando fios de fomePara morder o amareloAté que fique vermelhoE sacie sua gargantaDe zelo…
Refletir quebrada remendadanão era a mesmapeça com tanto sulcoderramava os chásnão servia ao caféderrubava a esperançad’equilíbrio à mesa quebrava galho como escoro calçouma seta noutra direçãoquando achou a funçãooutra vez veio a quedamuito mais fragmentos tornou-se quase quebra-cabeçafoi usada tanta colapraticamente perdeu a formaoutros contornosnovos desenhosmero peso de papel posso me deitar agorao trabalho refeitobateu…
Vidas beira-marcurvalimiarfronteiraentre mundosa ultrapassaro mar lambea areiasolta espumase espalhase contraimicroscópicasvidasse recolhema mergulharem espiraismistériosfractaisaté explodir emgigantescaonda. Viagem viajantessem sabero ponto finalsem conhecertodo o caminhoseguimos setasumadeterminaçãobrechasno percursoumabússola cravadano meiodo peitouma estradainventadao focono infinito. Pancadas esparsas pancadasde chuvatempo aforanome ambíguotempo adentropancadasde vidaesparsos eventosnunca se sabequando vemquando vãonão se esperanem de ondenem de quem. Ines Lempek é natural de Porto…
CORPO FECHADO Na cabeçaA marcaAncestralDe um povoNo peitoAs cicatrizesDas humilhações sofridasNas mãosAs rugasDa sabedoriaDa lutaDa resistênciaNo ventreA fertilidadeO amor à terraNos pésA base da vidaO apoioA certezaDo pertencimentoMesmo que muitas vezesA PátriaNão seja gentilTeu corpo fechadoReverbera gerações. PIÃO Na giraDos MundosGirasteFeito piãoSem direçãoDeslizaste pelo chãoA procura de um caminhoUma fenda, um buracoQualquer lugarDe pertencimentoPorémSó achasteO…
Reprodução do capítulo 1de Um Navio na Coxilha, mais recente romance de Luís Dill. Meu pai morreu duas vezes. Primeiro no rio Amazonas, depois aqui, em Forquilha Seca. Por coincidência, suas mortes ocorreram no mesmo dia, um 24 de agosto. Em 1932, ele se finou a bordo do Jaguaribe; em 1954, quando desembarcou do navio.…
A mulherzinha espia. De olho, no canto da casa. Se não lavo, não cozinho, não passo, ela fala. E eu nunca passo, sem parar! A mulherzinha faz fofoca, em pensamento, me dá rasteira, envenena minha benzedeira. Ela é dura comigo, por dentro. Desconfia de mim se fumo, se bebo. E se não, desconfia que não…
A Acabara o expediente e eu ia caminhando com a minha câmera fotográfica. Vi uma casa abandonada e achei estranhíssimo, qualquer empreiteira daria uma fortuna por ela. Bem, ali havia uma, e um casal de cisnes no pátio de cimento. Eram estátuas. O cisne maior, em algum momento da sua vida de pedra, erguia um…
Era noite, tarde, deitei, fui dormir, quando estava quase pegando no sono meu filho bateu na minha porta – Deixa dormir com você essa noite – pediu – estou assustado, tá ventando muito na rua – afirmou. – Tá bom, vem cá então – respondi Ele subiu na cama, me deu um beijo, agradeceu. Abracei-o,…
Alberto acordou atordoado após aquele atraso de alguns minutos. Banhou-se, botou sua blusa bege, as botas bacanas e a calça de brim. Estava na beca, bonitão. Tudo combinava completamente, como convinha para conquistar o coração da colega Carol. Decidiu degustar seus deliciosos damascos durante o deslocamento para não desperdiçar mais tempo desnecessariamente. Esticou o dedo…
Leia mais ALBERTO E CAROL: UM ROMANCE ALFABÉTICO, por Juliana Schaidhauer
L. me enviou outro e-mail. Isso significa que terei de lidar com o fato de amar L. e odiar absolutamente tudo que ele escreve. Não. Isso está errado. Eu não odeio o que ele escreve: apenas considero irrelevante. Eu odeio ter de encontrar alguma coisa para falar sobre seu texto. Há algo de banal em…
De repente o aroma do refogado na frigideira invade meu olfato e me desperta para o inesperado. Ouço com mais afinco o frigir do alho misturando-se à cebola, ao pimentão e à pimenta do reino. Deixo para acrescentar por último os tomates e o manjericão frescos. Provo o molho para certificar minha capacidade de acertar…
Tratava-se de ganhar a vida. Tratava-se, simplesmente, de suportar ganhar a vida daquela maneira. Queria acreditar que o salário compensava. Tinha feito a escolha errada lá trás, fizera muitas escolhas erradas – o curso, a desistência prematura do mestrado, o destino que havia escolhido para exercer a profissão. Sempre fizera escolhas tortas e muitos me…
Na noite anterior fomos a uma festa. Bebi muito e, como sempre, tivemos de voltar para casa antes dos amigos. Vicente me dissera muitas vezes que não suportava mais minhas bebedeiras. Eu prometia que não beberia mais, mas odiava o jeito que aquelas alunas do meu marido o tratavam. Discutimos muito, tenho a impressão que…
Vida saudável Amanhã acorde cedo. Lave o rosto e saia. Ao deparar-se com o dia frio, não desanime. Continue a caminhada. Persista. Não desista do seu objetivo. Depois de muito andar, retorne à sua casa. Deite-se no sofá e ligue a televisão. Pegue o telefone, disque o número e peça uma pizza. O mar Você…
Ana, entre as plantas, envelhecia. Caminhava no verde denso da frente de casa e sentia em cada passo trôpego de seus 85 anos a certeza de que o infinito também ficava grisalho. O tempo lhe era qualquer coisa abstrata que se perdia nas dobras da rotina: envelhecer, cuidar das plantas, deixar crescer a solidão em…
Era um início de tarde quente e abafada. Tínhamos acabado de almoçar e eu estava me preparando para sentar no sofá e assistir ao telejornal, como costumava fazer desde os tempos em que vivia com meus pais. Era a hora do cafezinho, de descansar um pouquinho antes do próximo turno. A conversa era frouxa, amenidades,…
Entre meados de julho e os primeiros dias de agosto Ana Clara comemorou seu aniversário e decidiu que queria morrer. Quinze anos recém feitos, não houve festa nem abraços. Nenhum parente ligou para marcar a data e as poucas amigas que tinha sequer postaram juras de amor nas redes sociais. Ao entardecer daquela sexta-feira de…
Há um silêncio dentro do canto dos pássaros que é como se eles cantassem dentro do próprio canto. Cada qual no seu horário, como numa atividade inversa, o que de melhor eles fazem, afinal, é revelar o silêncio a intervalos. A cada momento de quietude em que resta o ruído dos passos na areia e…