Por Lígia Sávio
Já conhecia vários poemas de Malu Baumgarten, gaúcha radicada em Toronto, Canadá, publicados no Facebook e no seu blog. Organizados agora numa estrutura muito bem elaborada pela autora, numa bela edição da Editora Bestiário selo Invencionática, adquirem outra dimensão. A capa e as ilustrações, produzidas por Elizabeth Baumgarten, filha da poeta, enriquecem a obra que é bilíngue, proporcionando a quem lê em inglês uma dupla satisfação.
Eu diria que “Poesia da Hora braba” deixa o leitor em estado de desassossego e – mais ainda – em estado de turbulência. O eu-lírico (aqui mais anti-lírico) conversa com uma humanidade dura, imunda e destrutiva (“vivo num mundo de monstros”, “o homem é o lobo do lobo o nome do meu medo é homem”) e, por vezes, paradoxalmente bela. Em contraponto, da natureza e sua diversidade, tão bem captada pela autora – a floresta, os pequenos animais da região em que vive, as aves, as nevascas, o rio, as flores – só advêm beleza e vida em estado puro. . Felicidade é estar próxima deste viver mais selvagem, nutridor e vital. E a poeta se identifica com um animal sábio e forte “uma gata velha”, “uma cadela”, que carrega dores e amores (que incríveis retratos de pai e mãe!) e resiste, abrindo caminho na neve, dançando no cemitério e no frio com que aprendeu a conviver. O sofrimento humano repercute na autora, que nunca será indiferente a ele. Uma das piores falhas dos habitantes da Terra seria deixar de sentir:
“Rezo ao meu medo: nunca me deixes calar diante da violência,
não me me deixes testemunhar brutalidade sem palavras de protesto
não me permitas aderir ao coro dos apáticos
Sejas tu meu amigo, medo, e parte meu coração se me tentar a indiferença.
Meu maior medo é não sentir.”
E nós sentimos com ela.
A poesia de Malu Baumgarten é realmente “ a poesia da hora braba”, marcada pela contundência e pela força. Poemas como “Brasil 2022” e “Meu nome é Eurídice” nos enlevam e perturbam a um tempo, mas também são marcantes as descrições e poemas narrativos que contam uma história de dor e de abandono e outras vezes mais coloquiais e leves, não sem uma certa ironia, como “Mom veio ao Canadá”.
E , por fim, em um dos mais belos poemas do livro. “Minha vida, uma não–história”, a autora faz sua profissão de fé:
“…paixão por tudo que é vivo, e ainda,
como tudo que vive, quero vida.”

