‘FALSO LAGO’, DE CAROLINA PANTA

Por Cristiano Fretta

O que há por trás da indicação de um livro? Que caminhos são trilhados ao dizermos para outras pessoas que uma determinada obra literária deve ser lida? Em primeiro lugar há a leitura individual, permeada de subjetividade, ato silencioso e íntimo, para dentro de si. Depois, em uma consciência de que a matéria e a estética do lido há de encontrar ressonância em outras subjetividades, faz-se a indicação, na certeza de que uma das capacidades mais formidáveis de qualquer obra de arte é perspectivar o universal a partir do individual.

É nesse sentido que gostaria de indicar o mais recente livro de Carolina Panta, Falso Lago (Editora Zouk, 172 páginas). O livro de Panta é, como o próprio título diz, alicerçado na extrema polissemia da água como representação de subjetividades. Dos filósofos pré-socráticos – que viam nela a origem da vida, como Tales de Mileto -, às leituras que tentam compreender a pós-modernidade como um incessável fluir – como a modernidade líquida de Bauman -, a água se constrói como uma metáfora poderosa e producente, sempre pronta a espelhar e representar o mais íntimo dos personagens. Impossível aqui não lembrar de Água Viva, de Clarice Lispector.

Luciana, a protagonista de Falso Lago, é uma assistente social que tenta não se deixar submergir na água de sua condição de ser mulher e mãe solo em uma Porto Alegre opressiva que está mais para São Petesburgo de Dostoiévski do que para a Rua dos Cataventos de Mário Quintana. O livro é atravessado pela rotina de cidade grande: cheiros, visões, pessoas, velocidade, pobreza, enfim, a vida como ela é, percebida por um ser humano cheio de contradições, desejos, medos, memórias.

Em Falso Lago, Porto Alegre se mostra para além do clichê, sobretudo no sentido geográfico: a cidade também é a região das ilhas, com sua pobreza, suas pessoas, suas histórias. Além disso, há o cinismo do poder público, repleto de convencionalismos vazios e despreocupado em fazer a manutenção das condições básicas de sobrevivência de qualquer porto-alegrense.

No entanto, apesar da geografia focada em Porto Alegre e nas ilhas, o livro de Carolina Panta é universal e, dessa forma, pode ser lido para além das fronteiras de representação do espaço físico da capital do Rio Grande do Sul. As polissemias vindas da obra se expandem e se espalham pelos olhos do leitor a todo instante. É necessário ler o livro, para sentir todo o poder dos sentidos dessa palavra – mesmo que seja para terminar a leitura com os olhos rasos d´água, como foi o meu caso.  

Leia mais do autor em Sepé.

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