‘NO FUNDO DO POÇO’, DE BUCHI EMECHETA

Por Graziela Jacques Prestes

Começa pelo fundo, não cai no poço. Não sei se já aconteceu com você, mas me peguei pensando nessa expressão em português, “no fundo do poço”, e suas possíveis combinações verbais com “chegar” e “cair”. “No fundo do poço”, da imigrante nigeriana Buchi Emecheta, é a fotografia geopolítica de quem já está ou talvez nasceu no fundo do poço e tenta sair com toda a dificuldade que se possa imaginar. De onde vêm a força, a concentração e a serenidade da protagonista?

A realidade das famílias assistidas pelo governo britânico e/ou pela prefeitura londrina da década de 1960 soa como um insulto à dignidade sob o olhar arguto da narradora, em primeira pessoa. São cinco filhos de um pai inexistente. Mulher sobrevivente de culturas que tanto nos diminuem, Adah é mãe em exercício crítico e constante. Se os filhos a amarão no futuro, não sabe, mas confia. As histórias trazidas emocionam e expõem arestas. Pedir para receber menos do que o trabalho valia para não perder o seguro social, por exemplo, e o empregador aceitar parecem peças rudimentares das escravidões milenares.

Nossa heroína não sucumbe, não se oprime e se perdoa em sua circunstância. Fica conosco seu coração feminino pulsante. Tradução exemplar da talentosa escritora Julia Dantas. Primorosa edição da Dublinense. Boa leitura.

Leia mais da autora em Sepé.

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