O menino
O menino era sonâmbulo
abriu a porta
no meio da noite e saiu
era inverno
flocos de neve caíam
sobre as calçadas
havia no ar uma luz azul
ele parou
em frente à fonte
a água estava petrificada
ele alcançou um estilete gelado
sua pequena mão o segurou
no ato, o pedaço de gelo se partiu
a noite seguiu nua, deserta
azulada
a pálida manhã
o encontrou
encolhido –
na soleira da porta.

Breves eternidades
uma mulher bonita
de sorriso franco
no aconchego do seu colo
o bebê descansa
a imagem preserva o laço
quanto tempo pode passar
e ainda assim ser preservado
quanta incerteza
sobrevoa os pensamentos
na curva dessa sobrancelha
quantos oceanos atravessa
a doçura desse olhar
na pele da memória
sempre a tecer breves eternidades!

A magia do tempo
Teus braços
abertos
meus braços
alongados
o encontro
no meio do caminho
Abraços doces
morango
com chocolate
carinhos
livros de cabeceira
Testemunhas oculares
salamandras
ondinas
e elfos
Lagartixas
e iguanas
paralisadas
sob a luz do sol
Lembro que David Bowie
não existe mais
mas ainda escuto
sua voz andrógina
ecoando no labirinto.

Ines Lempek é natural de Porto Alegre, morou em São Paulo e Brasilia. Estudou Psicologia na UFRGS, e especialização em Psicanálise e Cultura na UnB. Participou de oficinas de escrita criativa, publicou em antologias, revistas literárias e blogs, com poemas, haicais e historias curtas. Lançou em 2019 o 1° livro solo de poemas O Avesso do Clima, pela Editora Bestiário. Os poemas desta edição de Sepé estarão no seu próximo livro.

